Um cancelamento de plano de saúde virou notícia nos últimos dias, após uma idosa de 102 anos ter sido informada que seu contrato seria encerrado. Diante da comoção pública, haja vista a alta reprovabilidade da conduta, a operadora reanalisou o caso e entendeu por suspender o cancelamento do contrato.
Mas esse comportamento somente revela o quão nefasta é a prática, uma vez que deixa beneficiários à mercê da própria sorte.
A pergunta a ser feita é: se o assunto não tivesse dominado o noticiário, a operadora teria revisto a sua postura?
A resposta é não.
Todos os dias, milhares de beneficiários têm seus contratos rescindidos silenciosamente, sem que o público perceba e sem que as operadoras sejam incomodadas. Então, ao voltar atrás no caso dessa idosa, isso revela somente que as operadoras pretendem continuar com a prática para beneficiários em geral.
Mas isso é legal?
Primeiramente, é preciso entender que os planos de saúde são divididos em dois grandes grupos: os individuais e os coletivos. Os coletivos ainda são subdivididos em outros dois: os coletivos por adesão e os empresariais.
Nos planos individuais, a Lei de Planos de Saúde veda expressamente a rescisão sem motivo, salvo em caso de inadimplência ou fraude. Por muito tempo, os tribunais invocaram essa norma para impedir a rescisão imotivada em contratos coletivos, impondo, em último caso, a migração do contrato para planos individuais. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça – STJ entendeu que essa norma não se aplica aos contratos coletivos. Isso gerou uma mudança estratégica das operadoras.
Enquanto os beneficiários estão cumprindo período de carência sem poder usar o plano, as operadora estão satisfeitas. Ultrapassado esse prazo e com o início do direito à cobertura, as operadoras informam que a sinistralidade do grupo é muito alta e que não possuem interesse na apólice.
Isso é uma completa distorção da função social de um contrato de plano de saúde.
Diferentemente de um seguro de veículo, não pode a operadora selecionar qual contrato deve continuar ou não.
Para corrigir isso, somente uma mudança legislativa que estenda a vedação de rescisão dos planos individuais. Já há um projeto de Lei tramitando para que se altere a norma.
Mas há exceções?
A decisão do STJ excepcionou o direito à rescisão contratual pelas operadoras. Caso o beneficiário esteja em tratamento contínuo, é vedada a ruptura do contrato.
E a portabilidade?
A ANS permite a portabilidade de carências entre operadoras. No entanto, a atuação cotidiana revela que é praticamente impossível fazer essa portabilidade, haja vista os inúmeros obstáculos impostos pelas operadoras e a vigilância vacilante daqueles que deveriam fiscalizar as operadoras.
Também é corriqueira a prática de alguns corretores informarem da migração, portabilidade ou uma suposta “compra de carências”, mas que na verdade somente se revela como a aquisição de um contrato novo. Isso pode levar a um suposto pensamento de que ocorreu uma portabilidade, mas que o beneficiário somente percebe que não é, quando necessita do atendimento e ele é negado por carência ou preexistência.
Mas o que o beneficiário pode fazer?
O correto é que o beneficiário procure um especialista na área para que seja analisado o caso concreto e, se for o caso, ajuizar ação cabível para manter o contrato.
